No meio empreendedor — e dos negócios em geral –, o cenário ainda é de muita atenção. Principalmente aqui no Brasil. Tanto nas esfera mais altas quanto na estrutura geral de uma empresa, a igualdade de gêneros é um baita desafio. Da quantidade limitada de banheiros femininos ao baixo número de vagas para grávidas, são vários os motivos que levam a um inaceitável desequilíbrio no ambiente corporativo.
O que fazer para mudar essa situação? Como empoderar de fato, no sentido de dar mais poder de decisão às mulheres? Como abrir mais espaço nos cargos de liderança, equilibrar conselhos, equivaler salários… enfim, como valorizar a presença feminina no meio corporativo?
Uma vida de luta
Geovana Donella, CEO e fundadora da Donella&Partners, trabalha desde o início de sua carreira para mostrar como a liderança feminina não é só necessária, mas pode transformar a realidade de uma empresa.
Foi com o convite para assumir a superintendência da Alcoa que Geovana teve uma espécie de Day1. Ela ficou em dúvida se aceitava ou não o novo cargo, até que ouviu uma frase. Uma afirmação que não apenas a fez aceitar, como a estimulou, a partir dali, a batalhar pela igualdade de gênero nas empresas:
“Se você aceitar, será a primeira mulher superintendente na história da empresa”.
“Agora eu quero”, ela disse a si mesma. Ficou oito anos na empresa, contribuindo para gerar resultados cada vez melhores para a Alcoa.
Mas não era o bastante
As coisas iam muito bem, mas Geovana sonhava mais alto: “Queria ser presidente. Como a possibilidade de isso acontecer na Alcoa seria a longo prazo, resolvi ser presidente da minha própria empresa”.
Então, ela tomou a decisão de ir empreender. Abriu um negócio da China, literalmente: passou a produzir bolsas no país para vender aqui no Brasil. Mas ela encerrou os negócios quando os chineses começaram a vir para cá. “Parei no auge”, conta.
Depois, vieram viagens pelo mundo, novos aprendizados e um convite para ingressar no Grupo Multi, vindo do próprio fundador, Carlos Wizard Martins. Após isso, foi Presidente do Cel Lep. Mas, naquele momento, ela já tinha outra grande ideia em gestação: montar a Donella & Partners, empresa de consultoria em governança corporativa dirigida a organizações familiares. Por quê? “Isso sempre me fascinou. Acabei me especializando em empresas familiares, ao longo de minha carreira, e queria devolver o que aprendi”.
A única conselheira
Hoje, Geovana ajuda a compor aquelas porcentagens mencionadas no começo do texto: é CEO de sua empresa e conselheira de outras cinco empresas familiares. E o desafio é enorme: “Nos conselhos de que participo, quase sempre sou a única mulher. Só em um deles havia outra. E, se formos tirar dos percentuais de conselheiras no Brasil as filhas, netas e descendentes de fundadores de empresas, a coisa fica ainda mais complicada”. Com efeito: chegamos ao pequeno percentual de 3%.
Geovana tem certeza de que sua luta por um ambiente corporativo mais igualitário, embora longa, está só começando. E ela tem ânimo de sobra para persistir, para acreditar:
A mulher tem uma série de características e de valores que são diferentes daqueles dos homens. São mais intuitivas, não são somente racionais, o que faz toda a diferença para uma gestão, principalmente para um conselho. Comecei a olhar mais para tudo isso, a lutar por isso. Mas uma pergunta não queria calar: como teremos muitas conselheiras se não temos muitas presidentes?
Boa pergunta: como?
A própria Geovana aponta três caminhos possíveis para um ambiente corporativo mais igualitário:
1) empresas precisam se adaptar às particularidades da mulher. Ela se refere a demandas como o tempo necessário para se cuidar da família. “Por que as mulheres que são gerentes não costumam virar diretoras? Porque esta costuma ser a época em que as mulheres optam pela família, pelo casamento, pela maternidade”, provoca.
Para Geovana, as organizações precisam encontrar formas de viabilizar que as duas coisas aconteçam em paralelo. Precisam ajudar e dar condições para que as mulheres toquem essas atividades sem terem que abrir mão das carreiras. Horários mais flexíveis, home office, políticas de contratação de grávidas, e por aí vai.
2) Poder público precisa participar e conscientizar. “Não me refiro a leis”, afirma Geovana, “mas a campanhas de recomendação, de conscientização para a importância de se contratar e se valorizar as mulheres”. O governo precisa participar e dar o exemplo.
A Conselheira cita o caso do Canadá, que, a partir de 2006, desenvolveu uma política sólida de incentivo à igualdade de gêneros nas empresas. “O resultado foi que, em 2011, muito dessa igualdade havia sido atingida: vários dos cargos de conselheiras nas empresas do país foram ocupadas por mulheres”.
Aliás, o próprio poder público deu o exemplo. Em 2015, quando o primeiro-ministro Justin Trudeau assumiu, compôs o governo na base do 50/50. E quando questionado sobre o porquê dessa composição, deu aquela resposta que entrou para a história: “Porque estamos em 2015”.
3) Apoio masculino. Para Geovana Donella, nada acontecerá sem o apoio irrestrito por parte dos homens.
“Precisamos do suporte masculino para mudar de verdade. Precisamos do he for she. Se os homens não tiverem essa conscientização, pouco avançamos. Porque, hoje, os presidentes são homens, os conselheiros são homens, e por aí vai”.
Se os homens lá de cima não tiverem essa conscientização, somente a qualificação e currículos excelentes ainda assim não serão o bastante. Pouco mudará, porque são eles que coordenam os departamentos mais estratégicos da Empresa.
Começar agora, com o que temos e de onde estamos
Agora, se você acha que a igualdade de gêneros em empresas só faz diferença em valores abstratos, ligados às características de cada sexo, é melhor pensar de novo. Porque há números bem contundentes que provam que um ambiente mais feminino não é só mais harmonioso e justo: é mais rentável também.
De acordo com Geovana, empresas que têm mais de duas mulheres no board obtêm 66% a mais de retorno sobre o capital investido. Além disso, têm 53% a mais de retorno sobre o patrimônio.
Para explicar o porquê, Geovana nos convida a fazer um raciocínio muito simples:
Na imensa maioria das casas, Quem decide as finanças? Quem é que decide o que vai ter no jantar? Quem é que faz a lista de supermercado? Quem é que ajuda a programar as férias, as viagens? É a mulher. A mulher que é a decisora da compra, a mulher é quem opina até nas decisões do marido na empresa que ele trabalha. Por isso, a mulher deve estar lá em cima para traçar as estratégias e para fazer as escolhas. É por isso que luto pela igualdade de gêneros. Precisamos cada vez mais da visão ampla das mulheres.
Pois é. Os colegas de trabalho de Geovana e de outras mulheres que estão na linha de frente das transformações sabem bem disso. E são exemplos como esse que precisamos compartilhar. Quando essas histórias ganham o megafone, são capazes de transformar empresas, conselhos e estatísticas.
Fonte: Endeavor e PEGN