Baseada em Mountain View, na Califórnia, a Y Combinator é considerada a primeira aceleradora de startups do mundo. Em 12 anos de operação, seus programas já apoiaram mais de 1.400 empresas.
O portfólio é avaliado em US$ 80 bilhões e inclui companhias como Airbnb, Reddit e Dropbox. Especialista no desenvolvimento de negócios e plataformas digitais, o americano Geoff Ralston, 57 anos, passou a integrar o quadro de sócios da Y Combinator em 2011. Desde então, Ralston tem passado boa parte de seu tempo trabalhando para intensificar a participação de empreendedores de países emergentes no portfólio.
Ele se reuniu com a reportagem de PEGN para falar sobre o ecossistema brasileiro e os planos da aceleradora para o mercado local. Veja a seguir os melhores momentos da entrevista.
Qual é a sua visão sobre o ecossistema de startups brasileiro?
O Brasil é um lugar muito interessante para abrir uma startup. Tenho visto muitas pessoas com mentalidade empreendedora e criativa. O país abriga o maior mercado consumidor da América Latina. Essa característica oferece uma enorme vantagem para os empreendedores locais. É muito mais fácil começar um negócio quando você tem uma base extensa de clientes para atender. A tecnologia para criar essas soluções está cada vez mais acessível. Trata-se de um ótimo momento para fundar uma startup por aqui.
A turbulência política e econômica não atrapalha esse momento?
Os problemas econômicos e sociais são evidentes. O país também apresenta gargalos de infraestrutura e acesso a capital. É um cenário bem diferente do que existe no Vale do Silício, por exemplo. O grau de risco é mais elevado. É por isso que muitos brasileiros ainda preferem disputar um cargo público a empreender. Por outro lado, já temos alguns casos de startups que se transformaram em grandes empresas, como
o MercadoLivre. Esses exemplos são extremamente positivos para o ambiente de negócios. Eles fazem com que outras pessoas percebam que é possível criar suas próprias histórias de sucesso.
Qual é a estratégia da Y Combinator para o Brasil?
Assim como ocorre em todas as economias emergentes, as demandas do país favorecem o surgimento de ideias inovadoras. Queremos fortalecer a nossa presença entre os empreendedores locais, explicar como podemos ajudá-los. Mas ainda não temos uma estratégia definida. Por enquanto, a ideia é incentivar mais as empresas a se inscreverem no programa para que possamos conhecê-las melhor.
Vocês estão interessados em algum setor ou tecnologia em particular?
O nosso portfólio é bastante abrangente. Temos algumas áreas em que atuamos com mais intensidade. Mas o nosso posicionamento não é baseado em verticais. O foco está em negócios que sejam escaláveis e gerem impacto ao seu redor. Pode ser algo que está mudando o mundo, como plataformas de sequenciamento genético. Mas também pode ser algo aparentemente tedioso, como um sistema de gerenciamento de armazéns.
O essencial é que a solução apresente uma proposta de valor sólida para o seu público-alvo. O mais importante é o perfil dos fundadores. Procuramos por empreendedores resilientes e comprometidos. Sei que parece clichê. Mas é simplesmente mais fácil apoiar equipes incríveis. Mesmo quando elas não apresentam as melhores ideias.
Como vocês avaliam essas características em um candidato?
Fazemos perguntas para tentar descobrir como o empreendedor lida com adversidades. Pedimos para que os candidatos descrevam grandes desafios que superaram no passado — e o que fizeram para resolver esses problemas. Procuramos por pessoas que tenham a habilidade de se reinventar e lutar por suas ideias. Outra parte essencial do processo é o instinto e a experiência dos entrevistadores. Mesmo assim, nem sempre acertamos. O nosso modelo é baseado em previsões sobre o sucesso de uma empresa. E quando você tenta adivinhar o futuro, você tende a errar muitas vezes.
Muitas aceleradoras brasileiras têm apostado em programas patrocinados por grandes empresas. O que você acha desse modelo?
O corporate venture pode ser uma faca de dois gumes. Como parceria estratégica, pode ser algo muito poderoso para uma startup. O mesmo vale para a infraestrutura oferecida por grandes empresas. As corporações adotaram o discurso de que esse tipo de iniciativa as ajuda a serem mais inovadoras. Mas sempre existe um objetivo específico de retorno. E esse objetivo nem sempre é o mesmo dos fundadores das startups.
Num país como o Brasil, onde existe uma escassez de capital semente, esses programas podem ser uma alternativa para suprir essa demanda?
Sem dúvida. Mas ainda é preciso aumentar a oferta de capital de risco “independente”. Isso é essencial para construir um ecossistema de inovação sólido.
Como a Y Combinator equilibra essa independência com a pressão por resultados financeiros?
Tivemos a vantagem de ser os primeiros. Isso nos tornou uma referência entre empreendedores de diversos países e segmentos. Nosso segredo é manter o foco no produto. No caso de uma aceleradora, isso significa construir uma reputação de quem sabe ajudar outras empresas a alcançarem o sucesso. Nossos programas oferecem muito mais do que investimento. Focamos na ideia, no produto e nos clientes das startups.
Qual conselho você daria para os empreendedores brasileiros?
É quase sempre melhor tentar resolver um problema de um setor que você realmente conhece. A partir daí, crie uma solução baseada nas necessidades dos consumidores desse mercado.